23.3.11

Os cegos de Brügel

O Governo está morto. Só existe já o primeiro-ministro e nem ele existe, subsiste. Começou com o teleponto e com o teleponto termina. O resto é pior que pode acontecer a um Governo: ninguém acredita neles, nem os que deles se servem.
Manipulando estatísticas como um prestidigitador com lenços, para os responsáveis pelas finanças e pela economia os números de ontem não são os de hoje e ninguém sabe quais vão ser os de amanhã.
Caia ou não caia com o PEC, o Governo parece já a cena dos cegos do Brügel. O Presidente da República faz de cego quando não pode fazer de surdo. Para ele Sócrates não deve ser morto politicamente sim frito em fogo brando. Tudo isto e tudo o mais é jogo politiqueiro. Votar sim ou não, adiar a morte ou prolongar o estertor, esperar pelo Conselho Europeu ou pela ganância da agiotagem externa, tanto conta.
O País assiste para já espavorido, amanhã revoltado, a um espectáculo deprimente..
As oposições possíveis não conseguem reunir a confiança de que se precisa. Ninguém sabe quem é Passos Coelho, nem quanto vale, nem o que sabe, quase se ignora o que pensa. Para além da boa figura e da boa fatiota pouco mais há.
Lamento esta descrença. Ela vale pouco por ser minha, vale tudo por ser a de centenas de milhares de portugueses, os que não votaram, os que se arrependem do voto, os que ainda votam no que há com medo do que venha.
O sistema partidário português não oferece soluções. A democracia, prisioneira que está deste sistema, deixou de ser solução. A alternativa é ou uma ditadura ou uma revolução.
Combati o regime anterior, sofri na pele os efeitos disso. Não foi para esta miséria que se fez o 25 de Abril.

19.3.11

O cascagrossismo

Esta gente bem compra fatos caros e de fino corte, muda de óculos para parecerem letrados e por isso inteligentes. Não adianta.
Os partidos bem se esforçam por ter carne fresca, ainda que desconhecida, gente bonita para que os que trocam pelo corpo se lhes rendam na hora da urna.
O sistema político, que está nas últimas, bem tenta fingir que tem consigo os melhores, os mais aptos, aqueles em quem se pode confiar.
Mas não há nada a fazer quando lhes foge o pé para a chinela. Mostram então quanto tudo é postiço, fingido, quando o cascagrossismo ainda é o que as suas mentes produz, mesmo quando as suas poses disfarçam.
Passos Coelho saiu-se hoje com uma digna de tasca: «Portugal está com as calças na mão!». Vem numa entrevista ao Correio da Manhã e pode ler-se aqui
É a boçalidade às escâncaras, a alarvice verbal feita política. A canalha, achará graça ao chiste de baixo coturno. Os que exigiriam mais calam-se. São os que já não contam por não quererem saber.
Lugares onde se esperava haver contenção verbal tornaram-se locais de mau porte. Portugal afunda-se na vulgaridade, no plebeísmo; já não está de calças na mão, sim de rabo ao léu e sem cuecas...

12.3.11

Viva quem vive!

Ter vivido o tempo suficiente para ter assistido ao transformar-se em revolta a inquietação, mesmo quando ainda ingénua, da juventude. E ei-los na rua.
Ter vivido o tempo suficiente para ter purgado o pecado original de termos educado, mesmo quando iludidos, uma geração de apatia, consumismo, indiferença. Porque fomos nós.
Ter vivido o tempo suficiente para ter sabido conviver com a ideia de que, inconformistas na juventude, os enganámos, adaptando-nos, mesmo quando pesarosos, ao insuportável, gerando democraticamente os tiranetes que nos dominam. E somos o pesadelo do péssimo exemplo.
Ter vivido o tempo suficiente para termos visto a geração que tornámos rasca e à rasca a desenrascar-se nas ruas da manifestação. E nós com eles.
Ter vivido o tempo suficiente para serem eles, inflamados ainda só de protesto, o motor do sonho, a alavanca da mudança, a revolução que vem no coração do homem antes de se propagar ao âmago da sociedade onde vive.
A todos quantos são jovens, a todos quantos viveram o tempo suficiente para não terem envelhecido com tantos anos, viva!
Portugal ressurge do chão.  Viva, pois! Viva!