Houve tempos em que as pessoas ficavam um dia inteiro em casa e o telefone mal retinia. Hoje os telefones não retinem, cantam e gargarejam e ninguém está em casa salvo excepções. Houve tempos em que, a horas combinadas, um vulto feminino assomava, discreto, a uma janela. Hoje as janelas saltam impúdicas e chamam-se «pop up's», assim não se ponha ocupado no msn. Houve tempos em que as pessoas para se encontrarem avisavam com cartão e agradeciam com flores. Hoje está-se nessa, bora, na minha ou na tua, tanto faz.
Houve tempos em que o acto de estar era um reduto inexpugnável da individualidade, o receber uma condescendência social à civilidade, o aparecer uma forma de entretenimento para tornar todos contentes.
Era o tempo das visitas de cerimónia às famílias, do salão em que Madame pontificava, explêndida, do clube de ambiente inalado a conhaque e charuto para os cavalheiros, do chá das cinco remediado a scones entre amigas, o jantar formal em que meninos não entravam, tempos do piquenique com formigas de onde por vezes surgiam inesperados meninos.
Se calhar não houve um tempo com nada disto. Mas há um tempo em que a nostalgia de tudo isto já faz sentido, mesmo que impossível, mesmo que inaceitável, a ilusão uma arte de viver.