10.8.07

A morte do viril

Desde que a sociologia estatística fez a sua aparição com ares doutorais ela tem permitido provar tudo. A crendice supersticiosa do vulgo no positivismo que se apresente como ciência tem ajudado. Em nome disso orientam-se políticas e lançam-se detergentes, todos baseados na reconstituição do que as pessoas pensam. Em nome disso há ideologias persecutórias e de exclusão, racismos primitivos e imbecilidades domésticas. Nas noites eleitorais então é o auge do método: os resultados das urnas são sempre a mera confirmação das «sondagens» sociológicas.
Ninguém acredita na individualidade da pessoa, na liberdade do ser, no improvável da conduta humana. O «vocês são todos iguais», passa das zaragatas conjugais, ainda em pijama matinal, para os laboratórios universitários, de bata branca nocturna. Segundo este ramo do saber, nós não somos almas, somos números!
Por isso uma universidade, a de St. Andrews, conseguiu apurar e eis que o leio na imprensa da manhã, que «as mulheres consideram que os homens com traços efeminados são mais fiéis e susceptíveis de se empenharem numa relação longa do que os homens mais viris».
Mas mais: é que a mesma universidade conseguiu saber que «os homens com queixo quadrado, com nariz mais largo e olhos mais pequenos foram designados como mais dominantes, menos fiéis e com uma maior tendência para se revelarem maus pais, com personalidades menos calorosas».
Claro que o Lavater, fisiogonomista, que no século dezoito concluía sobre o carácter humano a partir das particularidades morfológicas do indivíduo, está hoje no mundo das velharias pseudo-científicas. E mesmo o Cesare Lombroso, quando encontra atavismos físicos em certos seres que os assemelhava à ferocidade animalesca, donde propensos à delinquência, já foi. Este último valorava a assimetria craneana e a pilosidade, como factores altamente relevantes. Os de St. Andrews, tal como os nazis, esses medem o queixo, e se os lábios são arredondados, os olhos maiores e as sobrancelhas mais curvadas. Talvez meçam outras coisas que não dizem.
Enfim, neste ler matutino há só uma coisa que me preocupa nesta manhã de sexta-feira, ao olhar-me ao espelho, e ao não me ver diáfano e imberbe, nem bem lançado de formas ou suave de maneiras. É que o raio do estudo conclui, pela boca do professor David Perret ,que «os nossos resultados contradizem as afirmações segundo as quais o machismo é sinónimo de boa forma física e de saúde».
É que com esta é que eles me arrumaram de vez: ser masculino de sexo e de aparência já eu tinha percebido que estava fora de moda, hoje entendi cientificamente o que sabia empiricamente o que nos põe debaixo do vigilante olho conjugal, mas, ó Céus, fiquei convencido universitariamente que nos larga no cemitério, antes dos outros.
Vou para a praia mais logo e quando me cruzar com um daqueles mandris musculados, de tanga, orangotangos peludos, de coleantes shorts, gorilas bronzeados, de bícepes ostensivos, ante o olhar guloso das mulheres dos outros e enxofrado das próprias, ainda os aviso, em nome da ciência, a bem da sobrevivência da espécie: «vais morrer pá! Não tarda nada, de tão macho tão macho que és, ficas teso que nem um pau, em rigor mortis perfeito, hirto e defunto, na quinta das tabuletas!».