12.1.09

O monumento à desumanidade

Há uma estação ferroviária que se chama Gare de Oriente. É um local inamistoso, em que um imenso pé direito simboliza a opressão de um céu de cimento, onde os grandes átrios são desertos gélidos para solitários viandantes. Acantonadas nos esconsos, como se escondidas de gente, bichos na floresta de betão, umas lojecas tristes, vendem sensaborias, algumas tragáveis como refeições.
Quem desenhou aquilo odiava comboios, tinha repugnância por viagens, rancor de todos os que são passageiros. Arquitecto da desolação fez ali o monumento à desumanidade.
Há a oriente de Lisboa e a Sul de Chelas um sarcófago por cima do qual passam comboios, nas tripas do qual passa o metropolitano, onde nos labirintos intermédios se atulham automóveis e nos entrefolhos urinados do qual estive eu e outros ensonados para a composição das sete e nove.
Na plataforma fazia frio. Quando não faz frio faz vento. Vindo de Auschwitz, os vagões entraram no horário, a caminho dos fornos crematórios das vidas queimadas a trabalhar. Alguns na ilusão da primeira classe.